Um sobre Zero #67
O concurso de popularidade que é chegar aos 100 milhões de utilizadores no menor tempo possível pode não ser o indicador de sucesso futuro
Olá, eu sou o António Lopes. Bem vindos a mais uma edição da newsletter Um sobre Zero.
Se querem invites para o Bluesky, então leiam esta edição com atenção, porque vou deixar aqui 2 códigos (escondidos) para quem for mais rápido. Dica: é melhor clicarem nos links, pelo sim, pelo não.
Um apontamento de humor
Esta já é bem antiga, mas como voltou a passar-me pela frente, decidi partilhar:
Concursos de Popularidade
O website do ChatGPT sofreu, pela primeira vez, uma descida de cerca de 10% no número de visitas e também no tempo de utilização do mesmo durante o mês de Junho. Esta descida pode estar associada a algumas razões mais evidentes, sendo que a principal é, provavelmente, o aparecimento da concorrência. Por um lado, os utilizadores agora já têm muitas alternativas: Bing Chat (Microsoft), Bard (Google), Claude (Anthropic), etc. Portanto, é normal ver algum declínio na utilização do ChatGPT.
Por outro lado, esta descida nota-se no website do ChatGPT em si, não na utilização do modelo que está por trás. Desde cedo que a OpenAI decidiu abrir a API para o seu modelo, permitindo que muitas outras empresas criassem produtos à volta do ChatGPT. Esses produtos também vão agora surgindo no ecossistema e também vão “roubar” alguns utilizadores ao próprio site do ChatGPT, por serem ferramentas mais especializadas ou mais direcionadas para fins específicos que são mais úteis para os utilizadores. Portanto, se formos analisar nesse prisma, até é possível que a utilização do modelo da OpenAI continue em crescimento.
Outras explicações possíveis para a descida na utilização do website podem ser tão simples como Junho representar o fim do ano letivo e, como tal, haver menos necessidade dos estudantes usarem esta ferramenta porque já não estão em aulas. Ou então simplesmente porque há agora mais preocupações com a privacidade e utilização dos dados que fornecemos a estes modelos, o que faz com que se use menos estas ferramentas.
Seja como for, é normal a novidade e o entusiasmo se irem desvanecendo ao longo do tempo. O que interessa perceber é o que vai acontecer a seguir.
Este gráfico ilustra aquilo que é normalmente a evolução de um novo produto no mercado e os caminhos possíveis. Imaginando que no caso do ChatGPT estamos agora a entrar na fase “Facing Reality”, é uma boa altura para avaliar o que realmente este produto nos irá trazer para o futuro. Agora que já começamos a estar de “cabeça fria”, já somos capazes de perceber como o produto nos poderá ajudar e em que medida é só show-off. E eu acredito que esta é apenas a fase que irá preceder o verdadeiro crescimento deste tipo de produtos (não quer dizer que seja exclusivamente o ChatGPT) e que irão cimentar a sua posição num novo mercado que virá para ficar (atingindo portanto a fase “Sustainable Market”).
Já outros “participantes” neste tipo de concursos de popularidade não irão, na minha opinião, ter tanta sorte.
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O novo produto da Meta, a rede social Threads, conseguiu o feito extraordinário de ter atingido os 100 milhões de utilizadores em menos de uma semana (para referência, o ChatGPT demorou 2 meses a chegar a esse marco). É claro que isto foi ao reboque da desgraça que tem sido a gestão do Elon Musk no Twitter e pelo facto das pessoas estarem sedentas de uma alternativa (o que explica também o crescimento da popularidade do Mastodon e do BlueSky). Mas neste caso, a subida astronómica foi logo seguida de um declínio de utilização (para metade) na semana seguinte.
Mais uma vez, é normal este tipo de declínio na popularidade, principalmente depois de um crescimento tão vertiginoso. Mas neste caso, eu acho que é mais o resultado do concurso de popularidade do que por mérito da rede social propriamente dita. Se analisarmos bem, a Threads não tem nada que a distinga do Twitter. A usabilidade é semelhante, tem até menos funcionalidades e a única coisa a favor é que neste momento ainda é novidade o suficiente para estar na fase da lua-de-mel. Mas a Threads não vai conseguir resolver os problemas que fazem as pessoas queixarem-se do Twitter.
Duvido que consigam (ou sequer queiram) abolir o racismo, o bullying, a xenofobia e o machismo que assolam o Twitter, porque isso representa “engagement”, e “engagement” representa audiência a quem podem depois vender anúncios. Afinal de contas, não nos podemos esquecer que a Threads é um produto da mesma empresa que gere redes sociais como o Facebook e o Instagram, onde a depressão adolescente é apenas uma consequência de fazer negócio. Aliás, é por isso mesmo que optaram por não lançar já a rede na UE porque estão ainda a tentar perceber qual será o impacto da nova legislação (Digital Markets Act) em produtos como este (mesmo sabendo que o problema não estará no armazenamento dos dados).
Apesar disto tudo, eu ouvi o episódio do podcast do Hard Fork com o CEO da Threads, Adam Mosseri, e notei ali um pingo de esperança na voz dele de que têm aqui uma oportunidade para fazer melhor que os outros produtos Meta e mudar assim a imagem da empresa. Mas não estou muito esperançoso.
O ADN daquela empresa é demasiado forte e o mais provável é irem pelo mesmo caminho do Facebook e Instagram. Aliás, já se começa a notar isso na forma como impedem que os utilizadores apaguem as suas contas, sem que isso apague também a conta do Instagram. Assim é realmente fácil chegar a (e manter) 100 milhões de utilizadores numa semana. Mas enquanto que eu acredito que o ChatGPT (e versões futuras) cheguem à fase de “Sustainable Market”, a Threads parece-me mais tender para o nível de “Failed Technology”. O futuro dirá se estou enganado.
Notícias de Inteligência Artificial
A Comissão Federal do Comércio dos EUA (FTC, em Inglês) iniciou uma investigação sobre a OpenAI, relativamente à potencial violação das leis de proteção dos consumidores. A FTC está preocupada com as práticas de gestão de risco da empresa para os seus modelos de IA (como o ChatGPT e o DALL-E), em particular em relação a questões de segurança, informações falsas ou maliciosas, e privacidade de dados. É certo que ainda não há legislação específica sobre este domínio - o que irá dificultar imenso a aplicação de quaisquer restrições à OpenAI - mas acho que podem não se safar de multas avultadas. E não nos podemos esquecer que quaisquer ações tomadas contra a OpenAI tornam-se depois precedentes a aplicar a outras iniciativas do género (Google, Microsoft, Meta, Anthropic, etc.)
A Meta anunciou que vai abrir o acesso ao seu modelo de linguagem LLaMa 2, permitindo às empresas, startups e investigadores fazerem uso do mesmo como bem entenderem (incluindo fins comerciais). Esta medida coloca-os em concorrência direta com os modelos GPT da OpenAI, e permite-lhes ir mais além ao nível da transparência e recepção de feedback (pelo facto da OpenAI ainda manter o acesso ao interior dos seus modelos fechado a sete chaves).
Mais uma profissão que está em vias de extinção por causa de vir a ser substituída por Inteligência Artificial: os árbitros de linha no Ténis. Um dos palcos mais importantes do mundo do Ténis, Wimbledon, está a considerar a possibilidade de substituir por inteligência artificial estes árbitros que avaliam se a bola bateu dentro ou fora de campo. O diretor do clube afirmou que não exclui a hipótese de avançar com esta iniciativa, uma vez que tenta equilibrar a preservação das suas tradições com a inovação tecnológica.
O Elon Musk continua a procurar formas de se redimir da tragédia que foi a sua compra (e consequente gestão) do Twitter. E como está com inveja de ver as outras empresas a trabalharem em IA sem que ele possa meter o dedinho, decidiu abrir uma nova empresa, que intitulou de xAI, dedicada a “entender a natureza do universo”… seja lá o que for que isso significa.
A Microsoft anunciou o preço para o seu novo produto Microsoft 365 Copilot, que integra o modelo de linguagem ChatGPT da OpenAI nas aplicações do Office. O custo será de 30 dólares por utilizador/por mês para determinados clientes do Microsoft 365. É um preço relativamente elevado, mas poderá justificar-se se aumentar substancialmente a produtividade do utilizador. Mas só saberemos se é mesmo assim quando começarem a sair os primeiros relatos sobre a ferramenta.
Outras Notícias
Cientistas da Rice University, nos EUA, desenvolveram um novo método de administração de medicamentos utilizando micro-partículas que, com apenas uma injeção/dose, podem libertar medicamentos em intervalos pré-determinados. Este método pode ser particularmente útil para os doentes idosos que têm dificuldade em tomar os seus medicamentos nos períodos indicados. Atualmente, a maioria dos medicamentos entra rapidamente no corpo criando um pico de ação e depois vai perdendo o efeito ao longo do tempo. Este novo método poderá proporcionar um controlo mais delicado dos níveis de droga no organismo permitindo um efeito mais duradouro e eficaz.
O organismo de standards IEEE reconheceu formalmente a Li-Fi, uma tecnologia que utiliza lâmpadas intermitentes para transferir dados sem fios. Com velocidades que variam entre 10 megabits por segundo e 9,6 gigabits por segundo, a Li-Fi oferece uma alternativa ao Wi-Fi. Esta é uma tecnologia que ainda está muito no início e só funciona em linha direta de visualização (uma vez que funciona com luz), mas apesar disso pode ser um complemento ao Wi-Fi na transferência de informação de alta velocidade em condições específicas.
O Conselho Europeu finalizou um regulamento que exige que todos os telemóveis lançados na UE tenham baterias facilmente substituíveis até 2027, com o objetivo de promover uma economia circular para as baterias. Embora a lei se aplique apenas à Europa, terá um impacto significativo a nível global, uma vez que os principais fabricantes, como a Samsung, a Apple e a Google, não criam dispositivos separados para diferentes regiões. Estou curioso é para ver como é que vão gerir este novo requisito e mesmo assim manter a certificação de impermeabilidade dos dispositivos.
Na Shopify tomaram uma decisão que eu gostava que fosse adoptada de forma mais global: o agendamento de reuniões passa a vir com o cálculo automático do custo real da mesma, transformando o tempo das pessoas convidadas para a reunião no valor monetário equivalente. Isto obriga as pessoas a pensar muito bem sobre a necessidade de se realizarem certas reuniões, tendo em conta o custo real que têm para a empresa.
Recomendações de leituras
GatesNotes - The risks of AI are real but manageable
O Bill Gates decidiu elaborar um testemunho mais completo sobre a sua opinião do impacto que a IA terá na sociedade. E ele aponta para um risco real mas que ele considera que ainda assim não será um risco tão existencialista como alguns acham que será.
Nota final
Apanharam um código Bluesky? Não? É melhor lerem com mais atenção.
Ou então esperar pela próxima edição da newsletter que pode ser que eu partilhe mais códigos.
Até à próxima!
António Lopes