Olá, eu sou o António Lopes. Bem vindos a mais uma edição da newsletter Um sobre Zero.
Um apontamento de humor
Apple Vision Pro quase nas lojas
É já na próxima semana, mais propriamente no dia 2, que o novo dispositivo da Apple, o Apple Vision Pro começará a ser vendido. Numa edição anterior da newsletter, eu já tinha deixado a minha opinião sobre o potencial deste dispositivo e sobre aquilo que achava que não era tão bom:
O preço não é de facto convidativo. 3500 dólares é uma justificação difícil para o utilizador médio. A Apple é conhecida por insistir em vender-se como algo especial e de qualidade superior e essa sensação de exclusividade vê-se no preço. Vai na mesma ser um sucesso com os fãs e early-adopters que compram tudo o que é Apple, mas a adopção em massa só vai aparecer quando o preço baixar para níveis mais aceitáveis.
A minha opinião sobre a sua utilidade é na verdade ao lado do que a Apple tenta vender. A Apple quer fazer crer que este não é um dispositivo que irá isolar socialmente as pessoas (por isso é que criou aquele ecrã com a visão esquisita dos olhos simulados). Mas eu acho mesmo que este dispositivo vai vingar pela sua abordagem na combinação do ecossistema Apple com este paradigma de computação espacial. Poder “espalhar” as aplicações e janelas num espaço muito mais abrangente e poder interagir com elas de forma mais interativa e gestual, tem um potencial de revolucionar o trabalho e o consumo de entretenimento.
Esta é a versão 1, aquela que ainda tem limitações (está agarrado a uma bateria externa, ainda é pesado). Não é muito diferente do primeiro modelo do iPhone que não tinha 3G e nem sequer copy-paste. Mas o que tem em comum com o iPhone original, é que o Vision Pro tem bastante potencial para marcar a posição da Apple numa nova forma de interagir com o mundo digital. E a versão 4 já vai ser muito mais leve, com uma duração de bateria muito melhor e com novidades que provavelmente incluirão serviços de IA generativa.
Agora a Apple irá enfrentar a verdadeira prova quando, no dia 2 de fevereiro, colocar este novo dispositivo à venda.
O arranque
Tinha referido anteriormente que achava que este dispositivo não ia ser um produto de massas, muito por causa do seu preço. Mas os rumores das pré-vendas, que rondam entre os 160 mil e os 180 mil dispositivos, mostram que há, mesmo assim, uma grande procura por este produto. Muito provavelmente, dentro deste grupo, estão incluídos os tais super-fãs e early-adopters que eu falei. De qualquer forma, seja ou não verdade que os números iniciais irão rondar estes valores, a Apple costuma apostar no longo prazo. E a adopção do produto nas suas próximas versões (com os sempre iterativos acrescentos de funcionalidades e reduções de preços) será naturalmente muito superior.
Mas o arranque do Apple Vision Pro fica marcado principalmente pela falta de algumas aplicações, nomeadamente, a Netflix, Spotify e YouTube, que não irão estar disponíveis agora no lançamento. É verdade que investir numa aplicação nativa, ainda por cima num novo tipo de ambiente com um paradigma visual completamente diferente, exige tempo e dinheiro para investir. E estas empresas têm de pensar muito bem se esse investimento compensa em relação ao ganho que poderão ter com a utilização das aplicações no Vision Pro.
Netflix, Spotify e Youtube fazem dinheiro com as subscrições e/ou anúncios. Qualquer uma destas formas de monetização exige um número elevado de utilizadores. Ora, os números iniciais de pré-vendas do produto não estão no nível dos milhões de utilizadores que estas empresas precisam. Ainda assim, eu tenho cá para mim que poderá haver aqui uma outra razão por trás desta recusa destas empresas em fornecerem uma aplicação no arranque.
A Apple tem batalhado nos últimos anos com muitas empresas pelo facto de cobrar 30% por qualquer venda ou subscrição de aplicações feitas no ecossistema Apple. Algumas dessas batalhas passaram mesmo para os tribunais onde a Apple teve de justificar este seu modelo de ganhos partilhados com uma percentagem tão elevada. Até recentemente, a Apple tem conseguido sempre esquivar-se a mudar este modelo e isso tem rendido bem para os cofres da empresa.
Mas agora, a Apple vai ver-se obrigada a permitir que as instalações de aplicações no ecossistema Apple possam vir de outros sítios que não a App Store. E com essa obrigação vem também outra obrigação de permitir que os pagamentos não tenham de ser obrigatoriamente por via do modelo em que a Apple cobra os 30%. Só que esta obrigação, para já, só irá acontecer na União Europeia. E, portanto, nos EUA, empresas como a Netflix, Spotify e Youtube vão ter de continuar a pagar o “imposto Apple”.
Será que esta recusa de fornecer aplicações nativas para o Apple Vision Pro, é uma forma de protesto destas empresas em relação a este “imposto” que a Apple tem cobrado ao longo dos últimos anos? Ou será que é uma forma de estas empresas tentarem aumentar o seu poder negocial com a Apple para esta assim renegociar a comissão para valores mais aceitáveis?
Como é que isto afeta o Vision Pro?
Um cliente que vai debitar 3500 dólares para usar um Apple Vision Pro tem toda a razão em avaliar se o investimento à cabeça vai compensar ou não. E saber logo à partida que uma série de aplicações (que são a norma hoje em dia) não vão estar disponíveis num dispositivo deste preço, pode ajudar algumas pessoas a tomar a decisão de não dar o passo da compra.
Contudo, a não existência das aplicações no seu formato nativo não quer dizer que não seja possível usar esses serviços. Tanto a Netflix, como Spotify e Youtube continuam a estar disponíveis através de um browser. E neste caso, o Safari (o browser da Apple) vai desempenhar aqui um papel fundamental. Se o Safari não funcionar bem em termos de usabilidade (dado que este é um novo paradigma de computação espacial), a experiência dos utilizadores pode ser altamente prejudicada e relegar o Vision Pro para um produto falhado.
Seja como for, eu acho que a prestação desta primeira versão do Apple Vision Pro não vai ser má e, quem sabe, até poderá relançar o interesse no mundo da realidade virtual/aumentada.
Notícias
Japão chega à Lua
A agência espacial japonesa aterrou com sucesso o seu módulo de aterragem lunar, SLIM, na superfície da Lua, conseguindo uma aterragem de alta precisão e estabelecendo comunicação. O Japão torna-se assim no quinto país a ser capaz de chegar à Lua. No entanto, um problema no sistema de energia pôs em risco a continuação da missão. Seja como for, é de louvar o esforço para continuarmos a conhecer mais sobre esta companheira mais próxima da nossa presença no sistema solar.
Mais avanços na saúde com base na IA
Investigadores do MIT utilizaram Deep Learning para descobrir compostos com potencial para matar bactérias resistentes a medicamentos, como a MRSA, que causam milhares de mortes em todo o mundo anualmente. O estudo demonstra que estes novos compostos apresentam baixa toxicidade contra as células humanas, o que se mostra promissor para o desenvolvimento de novos medicamentos. Os investigadores obtiveram estas informações sobre as estruturas químicas associadas à atividade antimicrobiana ao “abrir a caixa negra" dos modelos de Deep Learning. Isto é, os investigadores andaram a “escarafunchar” nos nós das rede neuronais para tentar perceber a forma como a ligação entre os vários nós influencia a criação dos compostos, o que levou à identificação de novas classes de antibióticos. Os compostos foram capazes de reduzir eficazmente a população de MRSA em modelos de laboratório e em ratos. Resta agora esperar até haver a possibilidade de testes em humanos.
A tecla da Inteligência Artificial da Microsoft
A Microsoft anunciou a adição de uma nova tecla dedicada nos teclados físicos dos PC Windows para lançar a sua ferramenta de IA Copilot. Esta nova teclar irá substituir a tecla de menu, ou a tecla Control direita em alguns teclados, e espera-se um lançamento mais amplo no final de fevereiro até à primavera, incluindo nos próximos dispositivos Surface.
Na edição anterior da newsletter, com as minhas previsões para 2024, eu tinha referido:
2024 vai marcar uma transição na forma como discutimos a IA generativa. Apesar de prever que o GPT-5 ainda vai gerar muita discussão (como referido no ponto anterior), acho mesmo que este vai ser o último modelo que vai ser amplamente discutido. O foco vai começar a mudar para os produtos propriamente ditos.
Parece que eu tinha razão, mas não fui capaz de prever que a Microsoft ia criar uma tecla física especificamente só para lançar um produto de IA!
EU vs. X
A União Europeia anunciou formalmente que suspeita que a X, a rede social anteriormente conhecida como Twitter adquirida por Elon Musk, está a violar as regras da UE de combate aos conteúdos ilegais e à desinformação. Este é o primeiro processo formal ao abrigo da Lei dos Serviços Digitais, que impõe obrigações adicionais às grandes empresas tecnológicas. A X poderá ser objeto de investigação e de eventuais sanções se for considerada em infração destas regras de desinformação. Tendo em conta que este ano vão acontecer uma série de processos eleitorais tanto nos EUA como na UE, esta batalha vai ser interessante de acompanhar.
Recomendações de podcasts
Search Engine - Is there a sane way to use the Internet?
Dois dos meus podcasters favoritos (PJ Vogt e Ezra Klein) juntaram-se para conversar e filosofar sobre a Internet e a dificuldade que é lidar com o desafio constante de enfrentar a dualidade de sensações e emoções do bom e do mau que a Internet nos traz. Não é um episódio para quem não gosta de devaneios e filosofias, mas eu gostei… muito.
Nota final
É verdade que ultimamente me tenho queixado do Twitter/X e a baixa qualidade que se tem vindo a sentir nos posts que vão aparecendo. Mas de vez em quando, aparecem-me algumas pérolas que sabem mesmo bem.
Até à próxima!
António Lopes